Durante anos, a ascensão econômica da China alimentou expectativas globais de que sua economia ultrapassaria a dos Estados Unidos. Entretanto, o cenário atual é diferente. O crescimento do PIB desacelerou e, segundo especialistas, a possibilidade de Pequim assumir a liderança mundial “está diminuindo”.
Essa avaliação foi feita por Eswar Prasad, professor da Universidade Cornell e ex-funcionário do FMI responsável por monitorar a China. Em entrevista ao jornal Nikkei, ele destacou os desafios enfrentados pelo país.
— “A China enfrenta uma série de fragilidades”.
Entre os obstáculos, Prasad citou “dados demográficos desfavoráveis” — com envelhecimento populacional e baixa taxa de natalidade —, a crise no setor imobiliário, o desânimo dos investidores e a ausência de um novo modelo de crescimento econômico.
Mesmo com um crescimento de 5,0% em 2024, atingindo a meta estabelecida pelo governo chinês, ele alerta que esse padrão pode não se manter. Caso a desaceleração persista, a economia norte-americana seguirá dominante.
Embora o país tenha demonstrado recuperação após a pandemia, o crescimento registrado é o mais fraco desde 1990, com exceção dos anos marcados por lockdowns da Covid-19. Após o fim das restrições, Pequim fixou uma meta de crescimento de “cerca de 5%” para 2023. No entanto, a retomada se mostrou irregular.
Prasad avalia que “mesmo uma taxa de crescimento de 4% a 5% será difícil de sustentar nos próximos anos”. Segundo ele, a chance de o PIB chinês ultrapassar o dos EUA está diminuindo a cada ano.
PEQUIM MINIMIZA A QUESTÃO
Apesar do debate sobre liderança econômica, a China não demonstra preocupação com sua posição global. Em janeiro de 2022, o então vice-ministro das Relações Exteriores, Le Yucheng, afirmou que o foco do país não é superar os EUA, mas “melhorar a vida da população e contribuir positivamente para o mundo”.
“Ultrapassar os EUA em PIB… Não estamos interessados nisso e não é isso que buscamos”, declarou Le, durante um evento na Universidade Renmin da China. “O que o Partido Comunista Chinês realmente almeja é atender ao desejo do povo por uma vida melhor.”
Para Prasad, no entanto, essa disputa ficou em segundo plano. O maior problema do país agora é o pessimismo generalizado em relação à economia. Ele argumenta que as iniciativas do governo comunista para restaurar a confiança no setor privado e impulsionar o crescimento “ainda carecem de um plano abrangente de reformas”.
O Banco Mundial também expressou preocupação com indicadores essenciais, como o consumo interno e o humor dos investidores. Em um relatório recente, a entidade classificou a economia chinesa como “frágil”.
CENSURA E REAÇÃO
A preocupação com a economia também se reflete no controle da informação. Em dezembro de 2023, usuários do Weibo — a rede social chinesa similar ao X (antigo Twitter) — começaram a receber alertas pedindo que evitassem críticas à economia.
A notícia, divulgada pela Bloomberg, revelou que internautas que comentaram sobre a situação econômica foram notificados. Embora o Weibo atue em um ambiente de rígida regulamentação na China, não ficou claro se essas restrições resultaram em banimentos ou suspensões de contas.
A mídia estatal, incluindo a agência Xinhua, reagiu às críticas, reforçando a mensagem de que a economia chinesa permanece resiliente. Uma hashtag no Weibo, “aqueles que falam mal da economia chinesa estão destinados a ficar desapontados”, ultrapassou 140 milhões de visualizações entre 14 e 18 de dezembro daquele ano.
O PESSIMISMO EM ALTA
Quando a China começou a despontar como potência global, em 2004, pesquisadores iniciaram uma pesquisa nacional perguntando aos chineses se sua condição financeira havia melhorado nos últimos cinco anos.
A percepção de progresso cresceu em 2009 e novamente em 2014, quando 77% dos entrevistados afirmaram estar em melhor situação.
Em 2023, ao refazer a mesma pergunta, esse número caiu drasticamente para 39%.
O estudo, intitulado “Getting Ahead in Today’s China: From Optimism to Pessimism” (“Progredindo na China de hoje: do otimismo ao pessimismo”), revela uma mudança significativa na percepção popular.
A crise econômica chinesa é a mais severa desde a abertura do país ao mundo, há mais de 40 anos. A recuperação pós-Covid, que deveria impulsionar o crescimento, mostrou-se apenas um alívio temporário.